quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

UM SONHO NO SÓTÃO


Antonio Luceni

Há dez anos concluía minha primeira graduação. Curso de Letras. Uma aventura àquela altura para um nordestino, como tantos outros nordestinos, retirado aos dois anos de idade sobre um pau-de-arara para, junto com a família, tentar a sorte na cidade grande – e põe grande nisso –, São Paulo.
Com muito esforço e dedicação consegui fazer o curso. Madrugadas a fio estudando – já que durante o dia tinha que trabalhar para ajudar em casa e saldar parte do valor da mensalidade que era complementada pintando painéis para festas infantis, feiras de livros e tudo o mais que aparecesse pela frente.
Com a ajuda de Deus e da minha família – principalmente de minha mãe, Maria, em janeiro de 2000 estava colocando grau em um curso superior o primeiro membro de nossa família inteira, tanto da parte de minha mãe quanto da de meu pai.
De lá pra cá nunca mais parei. A pós-graduação e o mestrado foram subsequentes, incluindo, mais recentemente, uma graduação em Artes Visuais.
No final do ano passado uma ideia louca ocorreu-me: prestar novo vestibular para um curso que surgira na cidade e que há muito tempo estava no sótão do meu coração: Arquitetura.
No sótão, mas nem por isso largado, encoberto ou empoeirado. Estava lá porque é um curso razoavelmente caro, universidades públicas distantes de Araçatuba e, como disse, um severino como eu tinha que se colocar em seu devido lugar. Onde já se viu, um nordestino metido a besta, com desejos e sonhos de conquistar o mundo querendo fazer um curso de Arquitetura? Coisa de bacana, de burguesinho, filhinho de papai...
Aí me coloquei em meu lugar. No lugar onde todo ser humano deve estar. Um lugar de sonho e de esperança. Um lugar de fé e de certeza que “em se plantando, tudo dá.”
Durante estes anos todos visitava o sótão constantemente. Limpava meu sonho, conversava com ele, alimentava-o ao andar pelas ruas da minha cidade e de outras tantas nas quais tive oportunidade de pisar, nas revistas especializadas, em minha própria casa, ao construí-la.
“Será que vou conseguir? Já faz tanto tempo que estou longe da matemática, da química, da física... Faz tanto tempo que não leio nada muito mais aprofundado de geografia e história... Acho que vou me expor. Nem precisaria enfrentar outro vestibular, é minha terceira graduação... Tô nem aí, nunca fugi de desafios, mesmo.”
Veio o dia da divulgação dos resultados do vestibular. Tentei buscar minha classificação pela internet, assim poderia encarar com mais tranquilidade qualquer que fosse o resultado. Bobeira, tudo congestionado. Tive que ir presencialmente.
A listagem em ordem alfabética. “Moça, o que significa esse ‘1’ na frente do meu nome?”. A resposta foi antecedida por um sorriso gentil. “É que você passou em primeiro lugar.”
Eu nem podia acreditar no que estava ouvindo. Segundo o próprio Bruno Toledo, que passou de sala em sala cumprimentando a todos os vestibulandos no dia da prova, o maior vestibular da história da Toledo. Depois fiquei sabendo também que o curso de Arquitetura e Urbanismo foi tão concorrido quanto o de Direito, já tradicional na instituição.
Nesta semana as aulas foram iniciadas. Começa aqui uma nova jornada em minha vida que se estenderá pelos próximos cinco anos. Há que se tomar um novo fôlego, há que se entusiasmar com tantas provas, trabalhos, noites a fio novamente...
Mas o que quer dizer isso frente a realização de um sonho?

Antonio Luceni mestre em Letras e escritor, Coordenador Regional da UBE.